Desde que eu a conheci, ela nunca mais saiu da minha lembrança. Ou do meu coração.
Perdi as contas de quantas vezes comecei a escrever sobre ela, mas nenhum texto parecia estar à altura dela, do nosso encontro, do seu abraço. E o quanto eu precisava da sua presença naquele momento.
Talvez esse seja mais um texto sobre ela muito aquém de seu significado. Mas em breve estarei de volta ao lugar onde nos conhecemos e, se não poderei reencontrá-la, gostaria de pelo menos escrever sobre o dia em que conheci dona Efigênia Carabina lá em Ouro Preto.
Se existe um nome perfeito para um anjo da guarda determinado a cuidar de mim, a alcunha Carabina me parece bastante apropriada.
Estávamos nós duas absorvidas por uma cena qualquer do cotidiano – um artista compartilhando suas tintas e telas com crianças – quando começamos a conversar. Até hoje não sei explicar o que aconteceu ali, naquele momento. Talvez um encontro de almas.
Ela me contou sua história. Disse que era compositora e cantora, neta de escravos, líder do Movimento Negro. Não dava paz para os políticos da cidade, sempre lutando por justiça social. Ganhou o apelido Carabina para combinar com o companheiro, que também tinha uma alcunha bélica da qual não me lembro.
Eu quis fotografá-la, ela deixou. Com uma condição: que a Igreja de Santa Ifigênia ficasse ao fundo.
Nós conversamos durante algum tempo sobre várias coisas, mas o que mais me lembro é do seu abraço e sua benção.
Depois de feita a foto, ela precisava ir. Estava apenas de passagem, mas sabia que tinha que conversar comigo. Tirou o colar e me deu de presente. “Fui eu que fiz”, contou. “É pra você nunca se esquecer de mim e do nosso encontro”.
Passados 6 anos, acredito que funcionou. O colar está comigo e a lembrança dela também.
Nunca mais nos encontramos. Ela partiu em 2019, aos 71 anos.
**Foto: Dona Efigenia Carabina, com a Igreja de Santa Ifigênia ao fundo (Arquivo Pessoal/Amanda de Almeida)